Spy vs Spy
28/04/12 16:32A ANALOGIA NÃO É minha, mas sim de uma figura de Brasília: a disputa em torno do Código Florestal ganhou contornos da série em quadrinhos “Spy vs Spy”, publicada pela revista “Mad” durante a Guerra Fria. A todo momento, a área ambiental do governo e do Congresso e o setor agrícola tentam explodir, apunhalar, esmigalhar e aniquilar um ao outro. Quem é Cia e quem é KGB nessa história não está claro.
Com a aprovação do relatório do deputado Paulo Piau na quarta-feira, precedida de um verdadeiro chamado às armas do PMDB, os ruralistas ganharam uma batalha importante. Ganharam, mas não necessariamente levaram: a maioria em favor de Piau foi de menos de cem votos, parecida com o placar da emenda 164 e não tão ampla quanto a lavada de 410 a 63 em favor do relatório de Aldo Rebelo, a “histórica” votação que o espião Henrique Eduardo Alves, líder do PMDB, evocou de forma um tanto agourenta em seu discurso ontem.
Essa margem (uma vitória “com sorriso amarelo”, como definiu o espião Jilmar Tatto, líder do PT), não é suficiente para derrubar um eventual veto da presidente Dilma Rousseff ao texto de Piau, para o que seriam necessários dois terços dos deputados. Cia e KGB agora mexem suas peças para neutralizar um ao outro da maneira mais rápida e eficiente possível.
Primeiro, há a definição sobre o veto. Não seria estranho se a espiã Izabella Teixeira pedisse a Dilma para vetar blocos inteiros do texto — como as disposições transitórias, uma sacada de mestre do senador Luiz Henrique (PMDB-SC), que concentrou as principais flexibilizações do código em capítulos contíguos. Dilma tem três dois bons motivos para aquiescer: 1) a proximidade da Rio +20 e a ampla repercussão internacional negativa das movimentações em torno do código, às quais a presidente tem dado atenção, sim; 2) o fato de agentes do serviço secreto terem tentado engrupir a presidente em torno de um acordo que liberaria de recuperar APP produtores com terras de até 15 módulos fiscais (pequenos latifúndios, se falarmos de Amazônia). Dilma não gostou nada quando descobriu e pode querer dar uma lição aos engraçadinhos; e 3) trucar o PMDB com seu índice de 64% de bom e ótimo nas pesquisas. Como lembrou o presidente da Câmara, Marco Maia, essa aprovação dá a Dilma margem para algumas estripulias. E vetar o Código Florestal dos ruralistas, convenhamos, pega bem com o eleitorado urbano/jovem/marinista.
Depois há os projetos de lei para enviar ao Congresso. Espiões da bancada ruralista já avisaram que vão propor um à Câmara com a definição de novas faixas de recuperação de APP, que supririam a principal omissão do texto de Paulo Piau e deixariam o governo com um bom argumento a menos para o veto. E o espião Jorge Viana (PT-AC) já recebeu de agentes do serviço secreto a incumbência de bolar um projeto a partir do Senado que restaure o espírito da lei mais ambientalmente ampla que foi derrotada na Câmara, mas com mais facilidades para pequenos produtores.
O Planalto sabe, porém, que mais uma dificuldade legislativa o aguarda aqui: é mais fácil fazer um projeto “ruralista” passar bem pelo Senado do que um projeto “ambientalista” passar pela Câmara.
PS: O editorial da Folha a respeito do Código Florestal (aqui, só para assinantes da Folha e ao Uol) está primoroso. Recomendo.